Você sabia que o uso de probióticos contendo Lactobacillus pode levar a infecções da corrente sanguínea em pacientes pediátricos imunocomprometidos?
Você sabia que o uso de probióticos contendo Lactobacillus pode levar a infecções da corrente sanguínea em pacientes pediátricos imunocomprometidos? Um novo estudo revelou um surto de bacteremia por Lactobacillus em pacientes que fizeram uso desses suplementos. Por isso, é importante ter cautela na prescrição de probióticos em pacientes com distúrbios intestinais graves. #probióticos #Lactobacillus #bacteremia #saúdeinfantil #imunocomprometidos.
Existe recomendação oficial para uso de probióticos em medicina?
Nos EUA em julho de 2018 o Pharmacy and Therapeutics Committee aprovou o uso de um probiótico de alta potência em pacientes com transplante de células hematopoiéticas (HCT) em casos de doença do enxerto contra o hospedeiro intestinal (GVHD), de colonização por organismos multirresistentes (MDRO) ou de infecção por Clostridioides difficile. Esse probiótico continha 112,5 bilhões de unidades formadoras de colônias (CFU) por capsula e era uma mistura de Streptococcus thermophilus, Bifidobacterium breve, B. lactis, Lactobacillus acidophilus, L. plantarum, L. paracasei e L. helveticus.
O que motivou a suspeita da relação dos probióticos com o surto?
Em novembro de 2019 foi realizada a investigação de um cluster de bacteremia por Lactobacillus em um centro de oncologia pediátrica e HCT. Essa publicação relata os resultados e avalia se há possibilidade de relação dos casos com o uso de probióticos na instituição.
Como foi estudada a relação dos probióticos com as infecções da corrente sanguínea?
Potenciais fontes de infecção foram identificadas por meio da revisão de prontuários e de entrevistas com a equipe hospitalar. Uma vez identificadas as possíveis fontes de infecção os pacientes que desenvolveram bacteremia por Lactobacillus foram identificados a partir de registros microbiológicos e os casos revisados. Em relação ao uso de probióticos foi calculada a porcentagem de utilização de probióticos em pacientes HCT hospitalizados (nº de dias de probiótico/nº de paciente-dia x100) e os dias totais de probióticos (número total de pacientes de HCT hospitalizados recebendo probióticos por dia durante o mês).
Para avaliar a relação entre o desenvolvimento de bacteremia e o uso de probióticos foi realizado o isolamento seletivo de Lactobacillus dos suplementos dietéticos. Foram então sequenciados os isolados dos probióticos e os isolados clínicos (amostras de sangue) e a relação entre eles foi avaliada usando pipelines de tipagem de sequência multilocus do genoma principal.
Quais os principais resultados?
Foram identificados 34 pacientes HCT hospitalizados que receberam pelo menos 1 dia de probióticos e desses 6 (17.6%) desenvolveram bacteremia por Lactobacillus.
A idade média dos pacientes foi de 4 anos (variando de 0.8-16 anos) e a bacteremia foi constatada mediamente no dia 41 (variação de 6-103) após o transplante e após 20 dias de hospitalização (variação de 3-78). O uso de probióticos foi recomendado devido a colonização por MDRO em 3 casos, devido a MDRO e GVHD em 2 casos, e sem indicação clara em 1 caso.
A relação genômica entre os isolados clínicos e os isolados dos probióticos foi demonstrada em 4 dos 6 casos.
Afinal, foi comprovada a relação do surto de infecção da corrente sanguínea com o uso dos probióticos?
A investigação revelou evidências de parentesco genômico entre os isolados clínicos e os isolados do probiótico, contudo os mecanismos de desenvolvimento da bacteremia não foram estabelecidos. Na publicação são mencionados 3 hipotéticos mecanismos de transmissão: por contaminação de cateter venoso central por fezes, contaminação de cateter venoso central no momento da administração do probiótico, ou por translocação do probiótico para a corrente sanguínea por meio de mucosa intestinal lesada.
Os autores destacam também que a dose necessária para efeitos clínicos dos probióticos é um parâmetro não bem estabelecido e que, como são comercializados como suplementos dietéticos, esses produtos não passam por revisão de segurança pré-comercialização pelo FDA (Food and Drug Administration) e podem apresentar diferenças significativas na viabilidade, pureza e composição bacteriana. Concluem, portanto, que testes clínicos bem desenhados e supervisão minuciosa do processo de fabricação de probióticos são necessários para avaliar a segurança de seu uso, principalmente em pacientes imunocomprometidos.
Quais as limitações do estudo?
Os achados desse estudo devem ser interpretados levando em consideração suas limitações. A principal é que esse foi um estudo descritivo que não inclui um grupo de controle. Além disso não foi possível estabelecer o mecanismo de infecção, sendo as hipóteses apresentadas de caráter especulativo.
Apesar dessas limitações os autores destacam que um estudo de coorte retrospectivo está em andamento na instituição para avaliar a incidência e risco relativo de infecções por Lactobacillus.
Fonte: Gilliam, C. H., Brazelton de Cardenas, J., Carias, D., Maron Alfaro, G., Hayden, R. T., & Hakim, H. (2023). Lactobacillus bloodstream infections genetically related to probiotic use in pediatric hematopoietic cell transplant patients. Infection control and hospital epidemiology, 44(3), 484–487.
Link: https://doi.org/10.1017/ice.2021.515
Sinopse por: Maria Julia Ricci
E-mail: maria.ricciferreira@edu.unito.it
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TAGs/palavras-chave: Probiótico, transplante de células hematopoiéticas, bacteremia, lactobacillus, oncologia pediatrica, fontes de infecção, genoma, suplemento dietetico, vigilância