Os programas de stewardship de antibióticos são fundamentais para a melhoria dos cuidados de saúde, mas a rotina prática desses programas nem sempre é ideal e depende de diversos fatores. Essa publicação analisa as principais iniciativas de stewardship e propõe métodos para melhorar a eficiência deles em hospitais de cuidados agudos.
Importância dos programas de Stewardship de Antimicrobianos
Os programas de stewardship de antimicrobianos (PSA) são fundamentais para a melhoria da qualidade dos cuidados em saúde e tem benefícios tanto para o paciente quanto para a instituição. O CDC estabeleceu os “Elementos Centrais de Programas Hospitalares de Stewardship”, delineando intervenções fundamentais que devem ser implementadas pelas instituições. Entre as diversas intervenções, a implementação de auditoria prospectiva e feedback (PAF), a pré-autorização (PRA) e o desenvolvimento de diretrizes institucionais especificas de tratamento, são consideradas prioritárias.
Essas intervenções prioritárias devem ser realizadas concomitantemente a outras tarefas importantes no ambiente hospitalar – como rastreamentos, educação de pacientes e outros profissionais, análises de dados etc – somando-se a carga de trabalho dos profissionais do time de PSA. Dada a importância de PSA, é importante compreender como melhorar a eficiência desses programas no mundo real, considerando os recursos e suportes disponíveis.
Estratégias para melhorar a eficiência dos PSAs
Essa publicação descreve algumas estratégias que podem ser empregadas para melhorar a eficiência das práticas de PAF e PRA, visando otimizar a eficiência e a utilização de recursos de programas de PSA.
Os autores ressaltam três pontos-chave para o sucesso de programas de stewardship antimicrobiana, são eles: a identificação de recursos, a priorização de iniciativas, e a determinação de prioridades.
Identificação de recursos: para a implementação e prosperidade de um programa de AS, os três principais recursos necessários são pessoal, tecnologia, e tempo.
– Pessoal: os profissionais envolvidos no PSA são um recurso chave para a funcionalidade do programa, sendo que os membros centrais ideais são um médico e um farmacêutico clínico, ambos com especialização em doenças infecciosas. Outros membros que são importantes: microbiologista clínico, especialista em tecnologia da informação (TI), epidemiologista hospitalar, representante da enfermagem, e profissionais de controle de infecção.
– Tecnologia: o nível de tecnologia envolvido no PSA é outro fator importante e depende da disponibilidade na instituição – podendo ser completamente automatizado e integrado até inteiramente manual e fora dos sistemas eletrônicos. Em um nível básico a tecnologia pode auxiliar com tarefas diárias dos profissionais de stewardship de antimicrobianos – como gerar listas de revisão como parte do PAF, facilitar a comunicação entre prescritores e o pessoal de PSA como parte do PRA, e gerar dados para auxiliar no rastreamento e relatórios. Em caso de mais recursos tecnológicos disponíveis, podem também auxiliar na gestão de um grande número de prescritores e no suporte a decisão clínica desses profissionais (como por meio de alertas/notificações de melhores práticas). Cada programa de PSA deve verificar a tecnologia disponível na instituição e avaliar o tempo e esforço necessários para adaptar essas tecnologias as necessidades do PSA.
– Tempo: refere-se as horas de trabalho necessárias para desenvolver, implementar, e manter uma iniciativa de stewardship de antimicrobianos; sendo que o tempo de manutenção é normalmente o mais duradouro e mais subestimado. Cada programa deve considerar de forma realística a quantidade de tempo disponível para realização de PAF e/ou PRA e outras atividades de stewardship de antimicrobianos nas jornadas de trabalho.
Priorização de iniciativas: cada iniciativa de AS requer investimentos e tem benefícios específicos, sendo importante que os PSA consigam priorizar essas iniciativas de acordo com as próprias necessidades. Os autores ressaltam duas iniciativas: a pré-autorização (PRA) e a auditoria prospectiva e feedback (PAF).
- Pré-autorização (PRA): a restrição do uso de certos antibióticos pode ser uma estratégia adequada para limitar o uso inapropriado, contudo, operacionalizar um processo de aprovação efetivo e seguro pode ser um desafio para os programas. Estratégias tradicionais de restrição requerem que um membro da equipe de PSA revise o prontuário para avaliar a escolha apropriada de antibiótico, porém esse cenário não é sempre realizável na prática. Sendo assim, uma alternativa é personalizar uma lista de medicações pré-aprovadas indicadas para as principais condições, de modo que a escolha possa ser imediatamente aprovada com possibilidade de verificação via PAF. Os autores ressaltam ainda que existem diversas outras estratégias que podem ser exploradas de acordo com as capacidades e limitações de cada instituição.
- Auditoria prospectiva e feedback (PAF): a realização de PAF consiste em revisão de prontuários para um propósito específico, avaliação da prescrição antibiótica com base nas diretrizes e práticas institucionais, aplicação dos princípios centrais de stewardship de antimicrobianos para otimizar o uso de antibióticos, e comunicação das intervenções recomendadas ao prescritor, preferencialmente de forma instrutiva/educacional. De forma geral a auditoria é praticada 48-72 horas após a prescrição com o intuito de otimizar a seleção, dose, rota, frequência e duração, de acordo com os resultados iniciais de cultura. Atualmente a estratégia de PAF é amplamente adotada por programas de stewardship de antimicrobianos mas os autores ressaltam que a combinação dessa estratégia com uma estratégia de PRA seria em última análise a abordagem mais adequada.
Determinação de prioridades: é importante, enquanto continuam advogar pelos recursos necessários, que os programas de PSA priorizem as iniciativas com maior potencial de sucesso, com base nas evidências disponíveis. Uma iniciativa ideal deve ser impactante, viável, acionável e mensurável, de forma a garantir que os recursos investidos sejam usados de forma eficiente e congruente com as metas do programa e da instituição. Essas mesmas 4 características também se aplicam aos alertas/notificações que fazem parte das iniciativas, de modo a salvaguardar a eficiência e carga de trabalho dos profissionais do time do PSA.
Como avaliar e determinar a priorização de iniciativas?
Os autores sugerem a utilização de uma Ferramenta para Priorização de Iniciativas de Stewardship Antimicrobiano (modelo disponível nos anexos da publicação) para avaliar o impacto, viabilidade, acionabilidade e mensurabilidade das possíveis intervenções. Essa ferramenta simples permite calcular pontuações para cada iniciativa e assim ranqueá-las da mais a menos prioritária. Sugerem também que uma vez selecionadas as iniciativas, se avalie também todas as notificações/alertas que deverão ser revisados pela equipe para que possam ser incluídos no fluxo de trabalho cotidiano – também nesse caso com uma ordem de prioridade que assegure a realização das ações mais importantes mesmo em cenários complexos.
Para a priorização das atividades os autores apresentam 3 abordagens: classificação em níveis, sistemas de pontuação e modelagem preditiva.
- Por níveis: as intervenções de stewardship são classificadas de acordo com a prioridade, acionabilidade e impacto potencial, e então agrupadas em 5 categorias. As ações de prioridade A e B são revisadas cotidianamente; as de prioridade C são revisadas periodicamente durante a semana de trabalho; as de prioridade D são delegadas a profissionais de saúde aliados (farmacêuticos clínicos, médicos ou enfermeiros); e as de prioridade E são passíveis de eliminação.
- Por sistemas de pontuação: são utilizados sistemas de pontuação, que podem ser integrados ao sistema de prontuários eletrônicos e somados automaticamente, para ranquear a prioridade de revisão dos pacientes. Essa pontuação, que deve ser customizada de acordo com as características da instituição, pode ser então utilizada para determinar a necessidade de intervir ou monitorar o paciente.
- Por modelos preditivos: é utilizada modelagem preditiva, com ou sem machine learning, para prever as demandas de stewardship de antimicrobianos de uma certa população. Essa abordagem requer que os dados da população – incluindo as práticas de prescrição mais frequentes, congruência com as diretrizes, intervenções sugeridas e aceitação das recomendações – sejam inseridos em modelos pré-construídos (amplamente disponíveis na literatura).
Por fim, os autores ressaltam a importância da constante avaliação das iniciativas consideradas prioritárias pois elas podem perder a utilidade com o passar do tempo. Para manter a eficiência de programas de AS a longo-prazo é fundamental que as iniciativas sejam reavaliadas e priorizadas de regularmente (mensalmente, trimestralmente ou anualmente).
Quais a principais conclusões?
Atualmente muitos programas de stewardship de antimicrobianos atingem os requerimentos mínimos delineados pelos Elementos Centrais do CDC, contudo a falta de recursos ou demandas concorrentes impedem a operação ideal de muitos desses programas. Os autores concluem, portanto, que ferramentas de priorização como as abordadas no estudo podem auxiliar os programas na melhoria da produtividade e no impacto geral desses programas em momentos de recursos limitados.
Fonte: Emily L Heil, Julie Ann Justo, Jaqueline T Bork, Improving the Efficiency of Antimicrobial Stewardship Action in Acute Care Facilities, Open Forum Infectious Diseases, Volume 10, Issue 9, September 2023, ofad412,
Link: https://doi.org/10.1093/ofid/ofad412
Sinopse por: Maria Julia Ricci
E-mail: maria.ricciferreira@edu.unito.it
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TAGs / palavras chave: CDC, antimicrobianos, antibióticos, programas de gerenciamento, iniciativas, recursos, CCIH, auditoria, feedback