Essa publicação faz parte da série de White Papers da Society for Healthcare Epidemiology of America sobre práticas em Unidade de Terapia Intensiva Neonatal.
Qual a justificativa da publicação?
As infecções da corrente sanguínea associadas à linha central (CLABSIs) estão entre as infecções invasivas mais frequentes em Unidades de Terapia Intensiva Neonatal (UTINs), contribuindo substancialmente para o aumento da morbidade e mortalidade dos pacientes. Os pacientes das UTINs frequentemente apresentam fatores de risco não modificáveis para infecção e tendem a necessitar de procedimentos invasivos de suporte a vida, sendo mais suscetíveis ao desenvolvimento de CLABSIs e que pode levar a hospitalizações mais longas, maior risco de comorbidades e maiores custos.
Qual o objetivo da publicação?
A adesão as técnicas adequadas de inserção e gerenciamento do cateter venoso central (CVC) pode reduzir as taxas de CLABSIs, mesmo entre os bebês de maior risco. Tendo em vista o panorama escasso de recomendações especificas para a população das UTINs, esse White Paper visa fornecer aos profissionais de saúde orientações práticas sobre a implementação de estratégias de prevenções de CLABSI em UTIN.
A publicação oferece respostas baseadas em evidências para perguntas frequentes sobre detecção e prevenção de CLABSI na UTIN. Nota-se que o intuito da SHEA é que essa publicação seja utilizada como uma companheira para a diretriz HICPAC para prevenção de infecções em pacientes da UTIN do CDC.
Quais as perguntas propostas e suas respostas?
1. Quais pacientes da UTIN podem se beneficiar do uso de anti-sepsia cutânea com clorexidina (CHG) na inserção e manutenção do CVC?
– A anti-sepsia da pele deve ocorrer para todos os bebês em UTIN e deve ser idealmente realizada com um produto contendo CHG
– Para bebês a partir de 8 semanas de idade utilizar 2% de CHG em 70% de álcool
– Para bebês com menos de 8 semanas de idade, a experiência clínica dos autores aponta que um produto contendo CHG pode ser usado com segurança. Além disso a FDA (Food and Drug Administration) afirma que CHG pode ser usada com cuidado em bebês prematuros ou com menos de dois meses de idade”. Nota-se que uma concentração de CHG ideal ainda não foi estabelecida para esse grupo.
– Para bebês nascidos com menos de 28 semanas de gestação, especialmente aqueles que ainda não completaram 7 dias de idade, as UTIN podem considerar o uso de 2% CHG aquosa para anti-sepsia da pele.
Observação – O consenso dos autores é de que anti-sepsia da pele a base de CHG e não com produtos a base de iodo é ideal para todos os bebês independente de idade gestacional ou peso ao nascer. Além disso, a inspeção frequente da pele onde houve aplicação de CHG é importante para detectar eventuais efeitos cutâneos adversos e, para evitá-los, a menor quantidade possível de solução contendo CHG deve ser usada, com remoção de qualquer excesso.
2. Com que frequência os curativos de CVC devem ser trocados em pacientes da UTIN?
– Para reduzir a quebra da barreira cutânea e o risco de deslocamento do CVC, os curativos devem ser trocados apenas se estiverem sujos, úmidos ou soltos, independentemente da idade gestacional (e não de acordo com um intervalo de tempo específico, por exemplo, a cada 7 dias).
– A integridade do curativo do CVC deve ser inspecionada pelo profissional de saúde designado pelo menos diariamente.
3. Em quais pacientes da UTIN devem ser usadas esponjas e outros curativos impregnados com CHG?
– Os curativos impregnados com CHG estão associados a um risco aumentado de dermatite de contato em bebês na UTIN. Benefícios não foram demonstrados em bebês da UTIN e esses produtos não são recomendados pelos autores.
– Se outras intervenções não conseguiram reduzir o CLABSI em um bebê na UTIN, ou se houver um aumento nas taxas basais de CLABSI da UTIN, os curativos impregnados com CHG podem ser considerados em bebês ≥28 semanas de gestação e ≥7 dias de idade.
4. As tampas desinfetantes com álcool devem ser usadas na UTIN?
– As UTINs podem considerar o uso de tampas desinfetantes como uma intervenção adicional para reduzir as taxas de CLABSI quando outras intervenções falharem.
5. Em quais pacientes na UTIN os benefícios do banho de CHG superam riscos?
– O banho de rotina com CHG não é recomendado para todos os bebês da UTIN.
– Em UTINs que têm altas taxas de CLABSI, mesmo com a implementação adequada de outras estratégias baseadas em evidências, o banho de CHG pode ser usado para bebês com CVCs. A frequência ideal do banho de CHG não foi estabelecida e depende da idade cronológica e da idade gestacional:
– Bebês a termo (≥37 semanas): pode ser realizado desde o nascimento.
– Bebês prematuros (<37 semanas de gestação): pode ser considerado a partir das 4 semanas de idade cronológica, reconhecendo o potencial de irritação cutânea e absorção sistêmica (esta última sendo de significado clínico desconhecido).
– Bebês prematuros (<37 semanas de gestação) e <4 semanas de idade: não é recomendado devido a potenciais efeitos adversos locais e sistêmicos. Nesses bebês, uma abordagem alternativa de banho com água estéril, com ou sem sabão neutro, pode ajudar a diminuir a contagem bacteriana na pele.
– Quando o banho de CHG é utilizado, as UTINs devem garantir uma vigilância cuidadosa para efeitos adversos locais e sistêmicos, incluindo reações alérgicas.
6. Quais são as estratégias práticas para minimizar a quantidade de coletas da linha central em pacientes da UTIN?
– As UTINs devem realizar a stewardship laboratorial e diagnóstica (ou seja, a consolidação dos testes necessários e a eliminação daqueles que não são clinicamente relevantes).
– Os profissionais de saúde devem evitar o uso do CVC para obter amostras para exames de sangue de rotina.
– Embora não seja uma recomendação universal, as UTINs podem considerar o uso de sistemas fechados de coleta de sangue.
Observação – A utilidade de obter hemocultura através de um CVC tunelizado continua sendo uma questão não resolvida.
7. Quando e como a terapia de bloqueio (lock terapia) antimicrobiana profilática deve ser implementada em pacientes da UTIN?
– A terapia de bloqueio profilática antimicrobiana como medida de prevenção universal não é recomendada.
– Bloqueios antimicrobianos podem ser considerados como uma intervenção adicional em bebês da UTIN com CLABSIs recorrentes.
Observação – Terapias de bloqueio são soluções usadas para fins profiláticos ou como tratamento adjunto para CLABSI quando o cateter não pode ser removido em um contexto de bacteremia. A solução contém agentes antimicrobianos altamente concentrado em combinação com anticoagulantes e é inserida no CVC. Quando utilizadas, as terapias de bloqueio devem ter atividade contra patógenos comuns de CLABSI, a habilidade de penetrar biofilmes, compatibilidade com anticoagulantes, e estabilidade prolongada – além de baixo risco de toxicidade e baixo potencial de induzir resistência antimicrobiana.
8. Profilaxia antimicrobiana deve ser administrada a pacientes de UTIN no momento da remoção do PICC (CVC de inserção periférica) para reduzir a incidência de CLABSI ou de sepse de hemocultura positiva?
– Os antimicrobianos profiláticos não são recomendados no momento da remoção do PICC.
9. Quais as considerações práticas para a implementação de uma equipe de acesso vascular (VAT) neonatal?
– As UTINs devem considerar o uso de VATs. Essas equipes demonstraram eficácia na redução das complicações relacionadas ao cateter e são econômicas/custo-efetivas.
– Os profissionais do VAT devem receber educação e treinamento clínico e, após a conclusão, demonstrar conhecimento e proficiência na inserção, cuidado e remoção do PICC, e um compromisso com a abordagem baseada trabalho em equipe.
– Os profissionais do VAT devem inserir com sucesso um número predefinido de PICCs, conforme definido pela delimitação de privilégios da instalação local.
– A equipe deve monitorar as medidas de qualidade relevantes.
Observação – A publicação define VAT como um grupo organizado de profissionais de saúde envolvidos na gestão (inserção, inspeção e manutenção) de acessos vasculares. Os autores ressaltam que uma equipe VAT determinada permite que as organizações centralizem a responsabilidade pelas atividades, contribuindo para a melhora dos desfechos clínicos.
10. Qual indicador deve levar uma UTIN a considerar a implementação de medidas preventivas adicionais?
– Zero CLABSIs é o objetivo aspiracional e potencialmente alcançável.
– Embora não haja um limite bem estabelecido acima do qual medidas adicionais de prevenção de CLABSI devem ser implementadas, uma variedade de métricas quantitativas ou qualitativas pode ser utilizada para identificar o sucesso da prevenção de CLABSI ao longo do tempo e determinar quando é necessária uma intervenção adicional.
– A decisão de estabelecer um limite para ação em uma UTIN deve avaliar uma variedade de fatores, incluindo:
– Uma taxa de infecção padronizada ou taxa de CLABSI que está acima da meta ou aumentando, apesar da implementação consistente das intervenções organizacionais atuais
– Interesse local em definir uma meta específica mais baixa com a contribuição da equipe de Prevenção e Controle de Infecção (prevencionistas de infecções, epidemiologista de saúde)
– Mistura de pacientes e acuidade clínica, o que pode prever a probabilidade geral de CLABSI
– Recursos e capacidade de pessoal para iniciar e/ou manter intervenções específicas e processos de prática.
– Qualquer métrica quantitativa ou qualitativa definida deve ser desenvolvida e aceita por todas as partes interessadas.
11. Quais elementos de bundles (pacotes de medidas) preventivos, além daqueles recomendados pelo CDC, poderiam ser considerados por uma UTIN com casos de CLABSIs em andamento?
– Práticas adicionais que carecem de evidências robustas podem ser eficazes. As UTINs podem considerar muitos produtos, tecnologias e processos diferentes.
– A implementação de um bundle expandido de cuidados de linha central para UTIN deve levar em conta os riscos e benefícios de medidas adicionais, bem como as necessidades, recursos e experiência local em instituições individuais.
– Se práticas adicionais forem implementadas, o impacto dessas práticas deve ser avaliado por um time multidisciplinar.
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Fonte: Muller M, Bryant KA, Espinosa C, et al. SHEA Neonatal Intensive Care Unit (NICU) White Paper Series: Practical approaches for the prevention of central-line-associated bloodstream infections. Infect Control Hosp Epidemiol. 2023;44(4):550-564
Link: https://doi.org/10.1017/ice.2022.53
Sinopse por: Maria Julia Ricci
LinkedIn: https://www.linkedin.com/in/mariajuliaricci
E-mail: [email protected]
Links relacionados:
Prevenção e controle de infecção em UTI Neonatal – https://www.ccih.med.br/prevencao-e-controle-de-infeccoes-em-uti-neonatal/
Barreiras pra adesão aos bundles para cateter central em UTI – https://www.ccih.med.br/barreiras-contra-adesao-aos-bundles-para-cateteres-centrais-em-uti/
Infecção neonatal – https://www.ccih.med.br/infeccao-neonatal/
Elaborado por Beatriz Grion