A descolonização à base de mupirocina em portadores de Staphylococcus aureus em hemodiálise não é amplamente implementada por preocupações a resistência à mupirocina. Neste estudo, a resistência à mupirocina em portadores de S. aureus foi infrequente, tanto na corrente sanguínea quanto nos isolados de S. aureus colonizantes. Além disso, nos anos 2003 a 2021, houve uma tendência decrescente na taxa anual de infecções da corrente sanguínea por S. aureus. Descolonização direcionada à base de mupirocina em portadores de S. aureus em hemodiálise é uma medida sustentável para prevenir infecções associadas aos cuidados em saúde.
Colonização e infecção por S. aureus
Pacientes em hemodiálise portadores de Staphylococcus aureus possuem um risco maior de infecções por S. aureus, morbidade e mortalidade. Em estudos anteriores, existem relatos sobre uma redução em até 80% do risco de infecção da corrente sanguínea por S. aureus na vigência do uso de descolonização contendo mupirocina, em pacientes em hemodiálise.
No entanto, a prática da descolonização nos portadores de S. aureus ainda não é amplamente implementada nas unidades de hemodiálise, principalmente devido a preocupações relacionadas a resistência à mupirocina e desafios logísticos.
Uma estratégia de triagem periódica dos pacientes em hemodiálise que realizaram a descolonização por serem terem cultura positiva para S. aureus, utilizando a mupirocina (screen-and-treat), tem sido implementada nas unidades de hemodiálise, da University of Geneva Hospitals (HUG) por mais de duas décadas.
Avaliação da resistência à mupirocina e taxas de infecção por S. aureus
O estudo teve como objetivos:
- Avaliar a resistência à mupirocina em isolados de S. aureus na corrente sanguínea e em amostras de colonização obtidas de pacientes em hemodiálise.
- Descrever as tendências temporais das taxas de infecção da corrente sanguínea por S. aureus em pacientes em hemodiálise.
Este é um estudo de coorte retrospectivo conduzido University of Geneva Hospitals (HUG), o maior Centro hospitalar terciário na Suíça. A triagem de S. aureus em todos os pacientes em hemodiálise é realizada uma vez a cada dois meses em todos os pacientes, desde 2001.
As amostras da triagem foram coletadas por meio de swab nas narinas e virilhas dos pacientes. Caso algum desses locais do corpo resultasse em cultura positiva, esse paciente era considerado portador de S. aureus e, então, começavam a receber tratamento tópico para descolonização. O tratamento consiste na aplicação de mupirocina intranasal à 2%, duas vezes ao dia, além de banho com clorexidina à 4%, por sete dias.
A triagem é concluída três dias após o término da descolonização, e em caso de diagnóstico positivo persistente, um segundo tratamento é prescrito. Caso necessário, um terceiro ciclo de descolonização é considerado individualmente.
Foi realizado uma análise retrospectiva dos dados coletados durante os anos de 2003 a 2021, incluindo dados prospectivos da vigilância de infecção da corrente sanguínea relacionadas à saúde, realizadas pela equipe de controle de infecção do HUG, e dos registros coletados pela unidade de hemodiálise.
Pacientes em tratamento intermitente por hemodiálise contribuíram apenas durante a execução da diálise; os pacientes que receberam, exclusivamente, diálise peritoneal foram excluídos.
Foi evidenciada maior resistência à mupirocina?
Durante os anos de 2013 a 2021, a resistência à mupirocina isolada na corrente sanguínea dos pacientes em hemodiálise foram raras.
Em vinte e oito (28) amostras foram identificadas cepas de Staphylococcus aureus meticilina sensível (MSSA) no isolado da corrente sanguínea dos pacientes em hemodiálise, e dessas amostras 24 foram testadas para resistência à mupirocina: 23 eram suscetíveis e 1 (4,2%), apenas, apresentou suscetibilidade intermediária à mupirocina.
Durante o mesmo período foi isolado na corrente sanguínea desses pacientes, 3 amostras com cepas de Staphylococcus aureus meticilina-resistente (MRSA), que foram testadas quanto a resistência à mupirocina: 2 delas eram suscetíveis e 1 resistente.
Durante o período de abril a julho de 2022, aconteceram três períodos de triagem para detecção de cepas de S. aureus, na unidade de hemodiálise.
Sendo quarenta e seis (46) pacientes rastreados, cada paciente foi rastreado pelo menos, duas vezes. No total houve 13 portadores de cepas do S. aureus (28,3%) em 17 isolados diferentes. Essas amostras foram testadas quanto a resistência à mupirocina: 11 pacientes apresentaram cepas de MSSA em 15 isolados e 2 pacientes com cepas de MRSA com 2 isolados.
Em 14 (93,3%) isolados, cepas de MSSA foram sensíveis à mupirocina e 1 (6,7%) resistente à mupirocina.
Os 2 isolados de cepas de MRSA foram susceptíveis à mupirocina.
Entre 2003 e 2021 foram identificados 92 portadores de S. aureus em corrente sanguínea de pacientes em hemodiálise, 62 causados por cepas MSSA e 30 causados por cepas MRSA.
A incidência anual da taxa de S. aureus em corrente sanguínea variou entre 0,037 a 0,881 por 100 pacientes em hemodiálise por mês.
Observou-se uma tendência decrescente na incidência de infecção da corrente sanguínea por S. aureus em 9,8% ao ano. A tendência foi semelhante para infecção da corrente sanguínea relacionada ao cateter causada por S. aureus com queda de 11,9% ao ano.
As taxas de incidência de MSSA e MRSA em corrente sanguínea, respectivamente, foi de 0,037 e 0,784 ocorrências, com uma variação de 0 a 0,349 por 100 pacientes em diálise por mês.
Os esforços contínuos no hospital para rastrear e tratar portadores de S. aureus em hemodiálise, por meio de um regime tópico de descolonização com a mupirocina foram bem-sucedidos com poucos danos em termos de resistência à mupirocina.
A implementação desta prática ao longo de 2 décadas não demonstrou um aumento relevante na resistência à mupirocina em isolados da corrente sanguínea e houve uma diminuição nos episódios de S. aureus em corrente sanguínea de pacientes em hemodiálise.
Avaliou-se, também, a resistência à mupirocina em isolados colonizadores de S. aureus por um período limitado, mostrando baixas taxas de resistência.
Quais as limitações do estudo?
O estudo apresenta limitações. Primeiro, os isolados de cepas de MRSA foram pouco frequentes. Os achados não podem ser generalizáveis. O efeito das medidas preventivas e de mudança na prática durante o período do estudo não foram avaliados.
Comentários finais
Aplicação a longo prazo de um regime de descolonização baseado no uso da mupirocina em pacientes em HD é uma prática segura. O uso da mupirocina não representou um aumento na resistência à mupirocina e pode ter contribuído para uma redução substancial no risco de S. aureus em corrente sanguínea.
Esta abordagem deve ser considerada como uma estratégia sustentável para prevenir infecções por S. aureus nesta população de pacientes de alto risco.
Fonte:
Hassoun-Kheir N, Buetti N, Olivier V, Perez M, Frossard J, Renzi G, Schrenzel J, Saudan P, Harbarth S. Targeted mupirocin-based decolonization for Staphylococcus aureus carriers and the subsequent risk of mupirocin resistance in haemodialysis patients – a longitudinal study over 20 years. J Hosp Infect. 2023 May;135:55-58. DOI:10.1016/j.jhin.2023.01.019
Link: https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/36805086/
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Sinopse por:
Thalita Gomes do Carmo
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Links relacionados:
Material suplementar do estudo: https://doi.org/10.1016/j.jhin.2023.01.019
TAGs / palavras chave: hemodiálise, Staphylococcus aureus, mupirocina, corrente sanguínea, resistência, triagem, Staphylococcus aureus meticilina-sensível (MSSA), Staphylococcus aureus meticilina-resistente (MRSA).