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CCIH CURSOS: HÁ 21 ANOS DISSEMINANDO SABEDORIA

CCIH-LOGO-NOVA

ENVOLVIMENTO DE ENFERMEIROS NO GERENCIAMENTO DE ANTIMICROBIANOS: UMA PESQUISA MULTICÊNTRICA

Os enfermeiros que receberam treinamento sobre resistência antimicrobiana possuem maior motivação, habilidade e comportamento ideal para realização da administração de antimicrobianos. Este trabalhou se baseou num modelo teórico de análise de comportamentos para avaliar o envolvimento da enfermagem no gerenciamento de antimicrobianos.

GERENCIAMENTO DE ANTIMICROBIANOS E O PAPEL DOS ENFERMEIROS

Os antimicrobianos são mais utilizados nos dias atuais do que em décadas anteriores, e estão associados a um aumento da resistência antimicrobiana (RA).

Uma grande ameaça ao aumento da RA foi a pandemia do novo coronavírus  (COVID-19), pelo aumento que houve no uso indiscriminado dos antimicrobianos.

A RA é uma das maiores ameaças à saúde humana, com uma estimativa de 4,95 milhões de mortes a cada ano associadas à RA, incluindo 1,27 milhão de mortes diretamente atribuíveis a RA. Prevê-se que este número aumente para 10 milhões de mortes por ano, juntamente com um custo cumulativo de US$ 100 trilhões até 2050, se nenhuma ação for tomada.

Um programa de ações que promovam o uso adequado dos antimicrobianos foi identificado como essencial para limitar a RA. Internacionalmente, a colaboração multiprofissional e o trabalho em equipe são reconhecidos como características-chave do papel dos enfermeiros, e essenciais para o cuidado seguro do paciente. No entanto, embora haja apelos para uma enfermagem presente no controle da RA, este papel ainda não foi descrito claramente, ao contrário dos profissionais farmacêuticos e médicos, sendo encontradas diversas barreiras para o envolvimento dos enfermeiros na resistência antimicrobiana. As barreiras incluem: a RA não é ensinada na graduação em enfermagem, enfermeiros relatam pouco conhecimento sobre os antibióticos e a resistência antimicrobiana, relações profissionais e hierarquias, a falta de envolvimento dos enfermeiros nos programas de RA, falta de empoderamento em termos de trabalho em equipe e uma falta de clareza sobre os papéis e responsabilidade dos enfermeiros frente aos novos procedimentos orientados pela RA.

Evidências crescentes apoiam o uso de teorias para identificar barreiras e facilitadores, a fim de mudar o comportamento dos profissionais de saúde.

O uso da Theoretical Domains Framework (TDF) fornece uma lente teórica para compreensão dos determinantes do comportamento. O TDF combina teorias complexas do comportamento em uma linguagem simplificada e acessível com 14 domínios:

1. Conhecimento;

2. Habilidades (psicológicas e físicas);

3. Papel e identidade social/profissional;

4. Crenças sobre capacidades;

5. Otimismo;

6. Crenças sobre as consequências;

7. Reforço;

8. Intenções;

9. Objetivos;

10. Memória, atenção e tomada de decisão;

11. Ambiental, contexto e recursos;

12. Influências sociais;

13. Emoção; e

14. Regulação comportamental que sustenta o comportamento.

Uma vez que os determinantes do comportamento são identificados e compreendidos, as intervenções direcionadas podem ser desenvolvidas.

Behaviour Change Wheel (BCW) é uma abordagem que auxilia na construção da intervenção, no diagnóstico dos participantes e na avaliação sendo, portanto, incorporado ao TDF. Este modelo é conhecido como “Modelo de Oportunidade, Motivação e Comportamento (COM-B)”. O modelo COM-B destaca a importância de especificar um ‘problema’ (por exemplo, a resistência antimicrobiana) em termos comportamentais (por exemplo, o comportamento dos profissionais frente a resistência antimicrobiana), e considera os três construtos principais: capacidade, oportunidade e motivação, que irão influenciar o comportamento humano.

Uma vez que as barreiras, por meio da TDF e do COM-B forem identificadas, a intervenção (por exemplo, educação, treinamento, modelagem) pode ser traçada.

O modelo COM-B permite um diagnóstico comportamental por entender que, os determinantes do comportamento, destacam a capacidade do indivíduo, tanto física (como habilidades) quanto psicológica (como conhecimento); sua oportunidade, tanto social (por exemplo, normas de prática) quanto física (por exemplo, tempo/espaço); e sua motivação, tanto reflexiva (por exemplo, crenças em capacidades e consequências) quanto automático (por exemplo, emoção).

QUAL FOI O OBJETIVO DO ESTUDO?

O objetivo deste estudo foi investigar o engajamento dos enfermeiros frente a resistência antimicrobiana e o que pode influenciar nessas atividades a partir da teoria Theoretical Domains Framework.

Os autores querem entender se o treinamento para mudança de comportamento frente a resistência antimicrobiana teve influência nos determinantes do Theoretical Domains Framework e se os resultados mudaram após a pandemia da COVID-19.

COMO O ESTUDO FOI REALIZADO?

Este estudo teve um desenho de pesquisa transversal.

RECRUTAMENTO E PARTICIPANTES

Foram convidados por email a participar do estudo 176 enfermeiros graduados, da prática clínica, em cinco diferentes países (Reino Unido, Brasil, EUA, África do Sul, Espanha), dos quais 136 indivíduos completaram esta etapa da pesquisa (taxa de resposta de 77,27%). Pelas redes sociais foram convidados mais 126 participantes, que completaram a etapa.

Esta distribuição rendeu um total de 262 respostas das seguintes nacionalidades: Britânico (134, sendo 11 escoceses e 5 galeses), português (43), brasileiro (19), sul-africano (14), espanhol (13), americano (12), Africano (12), Asiático (5), Irlandês (2), Australiano (1) e não divulgado (7).

A média de idade foi de 44,45 anos, sendo 223 mulheres, 37 homens, 1 não-binário e 1 não revelado.

MATERIAIS

A coleta de dados foi realizada por meio do Online Surveys nas línguas em inglês e português. A tradução para o português foi realizada por uma equipe de pesquisadores brasileiros e testada em três voluntários.

Na Seção 1 do questionário, os participantes foram convidados a indicar (usando uma escala Likert de sete pontos; 1 = nenhuma vez, 7 = sempre) se eles realizavam os comportamentos dos nove passos destinados a promover o uso responsável dos antibióticos [baseado em Courtenay et al. (2019)]. Ao final desta seção, os participantes foram convidados a indicar se o seu comportamento frente a resistência antimicrobiana tinha mudado, se melhorou ou piorou desde a pandemia de COVID-19. Uma caixa de comentários de texto livre foi fornecida para os participantes para descreverem seu comportamento frente a RA desde a pandemia de COVID-19.

NO TOTAL, 182 PARTICIPANTES (69,5% DA AMOSTRA TOTAL) FORNECERAM DADOS QUALITATIVOS.

A Seção 2 avaliou (com base em uma escala Likert de sete pontos (1 = discordo totalmente, 7 = concordo totalmente), os 14 fatores determinantes da TDF que podem influenciar o envolvimento dos enfermeiros na RA. As perguntas para cada domínio incluem: (1) Conhecimento – ‘Conheço o conteúdo e objetivos das diretrizes locais/nacionais que promovem uso responsável de antimicrobianos’; (2) Habilidades – ‘Tenho as habilidades para realizar as ações que promovem o

uso de antimicrobianos em ambiente hospitalar/comunitário durante meu turno com os pacientes, seus cuidadores e/ou colegas; (3) Papel social/profissional e identidade – ‘Fazer ações que promovam o uso responsável de antimicrobianos dentro de um ambiente hospitalar/comunitário durante meu turno com pacientes, seus

cuidadores e colegas é consistente com o meu papel como enfermeira’; (4) Crenças sobre capacidades – ‘Estou confiante de que se eu quisesse, poderia realizar as ações que promovem o uso adequado de antimicrobianos em ambiente hospitalar/comunitário durante meu turno com pacientes, seus cuidadores e/ou colegas; (5) Otimismo – ‘Em relação às ações que promovem uso responsável de antimicrobianos dentro de um hospital/comunidade durante meu turno com pacientes, seus cuidadores e/ ou colegas, estou sempre otimista com o futuro’; (6) Crenças sobre consequências – ‘Se eu realizar ações que promovam o uso responsável de antimicrobianos dentro de um ambiente hospitalar/comunitário durante meu turno com pacientes, seus cuidadores e/ou colegas, beneficiará a saúde pública’; (7) Reforço – ‘Sempre que realizo as ações que promovem o uso responsável de antimicrobianos dentro de um hospital/ambiente comunitário durante meu turno com pacientes, seus cuidadores e/ou colegas, sinto que estou fazendo a diferença’; (8) Intenções – ‘Pretendo realizar as ações que promovem o uso responsável de antimicrobianos dentro de um hospital/comunidade com pacientes, seus cuidadores e/ou colegas durante meu próximo turno’; (9) Objetivos – ‘Durante meu turno, alguma outra coisa na minha agenda geralmente tem prioridade sobre as ações que promovem o uso responsável de antimicrobianos com pacientes, seus cuidadores e/ou colegas’; (10) Memória, atenção e processos de decisão – ‘Durante meu turno dentro de um ambiente hospitalar/comunitário com pacientes, seus cuidadores e/ou colegas, muitas vezes me esqueço de realizar as ações

que promovam o uso responsável de antimicrobianos’; (11) Ambiental, contexto e recursos – ‘Dentro do contexto sociopolítico, há apoio financeiro suficiente das autoridades locais/alta administração para realizar ações que promovam o uso responsável de antimicrobianos dentro de um ambiente hospitalar/comunitário durante meu turno com pacientes, seus cuidadores e/ou colegas’; (12) Influências sociais – e ‘A maioria das pessoas cuja opinião eu valorizo ​​aprovaria minha atuação minha performance nas ações que promovem o uso responsável de antimicrobianos dentro de um ambiente hospitalar/comunitário durante meu turno com pacientes, seus cuidadores e/ou colegas’; (13) Emoção – ‘Durante o meu turno, consigo desfrutar da minha rotina; (14) Regulação comportamental – Eu tenho um plano claro sobre como vou realizar as ações que promovem o uso responsável de antimicrobianos dentro de um hospital/comunidade durante meu turno com pacientes, seus cuidadores e/ ou colegas’.

A Seção 3 coletou informações demográficas gerais incluindo idade, sexo, nacionalidade, ambiente de trabalho/assistência, tempo no cargo exercido e tempo de habilitação como enfermeiro. Essa seção também coletou detalhes sobre o treinamento em RA, perguntando ‘Você recebeu algum treinamento sobre RA?’ Esta pergunta foi seguida por: ‘Em caso afirmativo, quanto tempo durou este treinamento (ou seja, dias/semanas/meses)?’.

O questionário completo foi testado em oito participantes internacionais (não incluídos no estudo final) em Dezembro de 2020 antes da coleta de dados do estudo principal.

PROCEDIMENTO

Foi realizada uma amostragem de conveniência para recrutar enfermeiros ao redor do mundo. A coleta de dados ocorreu entre fevereiro e junho de 2021 durante a pandemia de COVID-19. O retorno dos questionários ocorreu de forma lenta.

QUAIS FORAM OS PRINCIPAIS RESULTADOS DO ESTUDO?

O comportamento mais citado pelos enfermeiros foi: ‘aplicação de precauções padrão de controle de infecção’ e o comportamento menos realizado foi ‘iniciar/mudar de antimicrobianos intravenosos para terapia oral e/ou a descontinuação da terapia antimicrobiana”.

TREINAMENTO DA RESISTÊNCIA ANTIMICROBIANA

Dos 254 respondentes a esta pergunta, 106 (41,7%) relataram que nunca receberam treinamento para RA e 148 (58,3%) relataram ter recebido algum treinamento. Este treinamento variou de 2 horas até várias horas, e foi atualizado anualmente ou composto por módulos estendidos sobre o tema da RA.

O desempenho no comportamento frente a RA foi significativamente maior entre aqueles que receberam treinamento em comparação com aqueles que não receberam treinamento. Observando os comportamentos frente a RA, aqueles que receberam treinamento pontuaram significativamente mais para sete dos nove comportamentos em comparação com aqueles que não receberam treinamento.

ENQUADRAMENTO DOS DOMÍNIOS TEÓRICOS

A análise de confiabilidade indicou que 10 dos 14 domínios da TDF tinha um alfa de Cronbach alto ou aceitável (>0,6), mostrando consistência na medição.

Os domínios do TDF que não tiveram um bom desempenho foram: ‘Crenças sobre

as consequências’, ‘Reforço’, ‘Metas’, ‘Durante o meu turno, alguma outra coisa na minha agenda frequentemente prevalece sobre as ações que promovem o uso de antimicrobianos com pacientes, seus cuidadores e/ou colegas e ‘Memória, atenção e tomada de decisão’.

INFLUÊNCIA DO TREINAMENTO SOBRE A RESISTÊNCIA ANTIMICROBIANA NOS DOMÍNIOS DO TDF

A partir do teste-t para amostras independentes provou-se que havia diferenças em todos os domínios do TDF entre aqueles que receberam o treinamento e aqueles que não receberam treinamento. Em todos os casos, aqueles que receberam o treinamento obtiveram pontuações mais alta nos determinantes do comportamento em comparação com aqueles que não receberam o treinamento.

Vinculando essas pontuações com o modelo COM-B observa-se que aqueles que

receberam treinamento tiveram maior capacidade, oportunidade e motivação para realizar atividades relacionadas a resistência antimicrobiana.

MUDANÇAS DESDE A PANDEMIA DE COVID-19

Quando perguntado se o comportamento frente a resistência antimicrobiana havia mudado desde a pandemia da COVID-19, numa escala de 1 a 7 (1 = discordo totalmente, 7 = concordo totalmente), os enfermeiros responderam com uma média de 4,35 pontos na escala likert, sugerindo que havia algum concordância de que o comportamento frente a resistência antimicrobiana tinha mudado.

Não havia nenhuma diferença real entre aqueles que receberam o treinamento para RA e aqueles que não receberam o treinamento. Quando foi perguntado se o comportamento frente a resistência antimicrobiana havia melhorado desde a pandemia de COVID-19, os enfermeiros responderam com uma média de 4,46 pontos na escala likert, que houve algum aumento.

De novo não havia nenhuma diferença real entre aqueles que receberam o treinamento e os que não receberam o treinamento.

Finalmente, quando perguntados se seus comportamentos frente a resistência antimicrobiana diminuíram desde o COVID-19, os enfermeiros responderam uma média de 2,02 pontos na escala likert, mais próximo da âncora ‘discordo totalmente’, sugerindo que seu comportamento frente a RA era menos provável de ter diminuído.

RESULTADOS QUALITATIVOS

Os comentários de texto livre relataram que a adoção de uma série de comportamentos frente a resistência antimicrobiana ocorreram após a pandemia de COVID-19. Isso incluiu maior prevenção e práticas de controle de infecções (por exemplo: maior número de pessoas na equipe, equipamentos de proteção, higiene das mãos, uso de máscaras, maior limpeza das superfícies e melhora de comportamentos envolvendo). Os participantes também gastaram mais tempo em comportamentos centrados no paciente (incluindo um maior número de consultas virtuais, aumento da prescrição e educação) e colaboração multiprofissional da prática (incluindo uma maior comunicação com os membros da equipe e rondas multidisciplinares nas unidades).

QUAIS AS LIMITAÇÕES DO ESTUDO?

Este estudo teve algumas limitações, como o uso de escalas likert, sem comparação antes e depois. No entanto, este estudo acrescenta evidências de que pode ter havido mudanças no comportamento dos enfermeiros em relação à RA desde a pandemia de COVID-19. A confiabilidade das escalas foram testadas e consideradas aceitáveis, mas a interpretação das perguntas subjetivas podem ser limitadas.

Uma alta proporção de participantes do Reino Unido pode tornar os resultados menos generalizáveis ​​internacionalmente.

QUE COMENTÁRIOS E CRÍTICAS FINAIS?

Em conclusão, esta pesquisa, identificou os benefícios do treinamento do comportamento frente a resistência antimicrobiana e de seus determinantes que foram: conhecimento aprimorado; habilidades; papel social/profissional e identidade; crenças sobre capacidades; otimismo; crenças sobre consequências; reforço; intenções; metas; memória, atenção e tomada de decisão; contexto ambiental e recursos; influências sociais; emoção; e regulação comportamental.

A pandemia de COVID-19 levou a uma melhora no comportamento da resistência antimicrobiana, independentemente do treinamento anterior, embora mais pesquisas sejam necessárias para determinar o impacto que os enfermeiros tiveram sobre o uso de antimicrobianos globalmente.

FONTE:

Chater AM, Family H, Abraao LM, Burnett E, Castro-Sanchez E, Du Toit B, Gallagher R, Gotterson F, Manias E, McEwen J, Moralez de Figueiredo R, Nathan M, Ness V, Olans R, Padoveze MC, Courtenay M. Influences on nurses’ engagement in antimicrobial stewardship behaviours: a multi-country survey using the Theoretical Domains Framework. J Hosp Infect. 2022 Nov;129:171-180. Epub 2022 Jul 16. PMID: 35843415. https://doi.org/10.1016/j.jhin.2022.07.010

LINK:

https://www.journalofhospitalinfection.com/article/S0195-6701(22)00227-4/fulltext

SINOPSE POR:

Thalita Gomes do Carmo

E-mail: Thalita.monografia.ccih@gmail.com

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Linkedin: https://www.linkedin.com/in/thalita-gomes-do-carmo-5957a85a/

LINKS RELACIONADOS:

Behaviour Change Wheel: Michie S, Atkins L, West R. The behaviour change wheel: a guide to designing interventions. Sutton: Silverback Publishing; 2014. 

Theoretical Domains Framework (TDF): Cane, J., O’Connor, D. & Michie, S. Validation of the theoretical domains framework for use in behaviour change and implementation research. Implementation Sci 7, 37 (2012). https://doi.org/10.1186/1748-5908-7-37  

O papel da enfermagem na gestão da prescrição de antimicrobianos –

https://www.ccih.med.br/o-papel-da-enfermagem-na-gestao-da-prescricao-de-antimicrobianos/

Stewardship de antimicrobianos: gerenciando o uso dos antimicrobianos para salvar vidas –

https://www.ccih.med.br/stewardship-de-antimicrobianos-gerenciando-o-uso-dos-antimicrobianos-para-salvar-vidas/

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