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Foco nas pias – um surto de Pseudomonas aeruginosa multirresistente em UTIs

Esse estudo descreve a identificação e controle de um surto causado por bactéria gram-negativa em unidades de terapia intensiva em um hospital Suíço. Os autores relatam as medidas e procedimentos de controle e prevenção de infecção adotados para contenção do surto.

Qual a justificativa do estudo?

O controle e a prevenção de infeções, com particular ênfase nas infecções relacionadas à assistência à saúde (IRAS), são parte fundamental do cuidado à pacientes internados em unidades de terapia intensiva (UTI). Essa coorte de pacientes apresenta maior fragilidade, incluindo maior presssão de seleção para organismos multirresistentes, sendo fundamental que a ocorrência de surtos seja prevenida de forma eficaz e controlados rapidamente para evitar o aumento da morbidade e mortalidade desses pacientes.

As bactérias Gram-negativas possuem a capacidade de persistir em ambientes úmidos e se disseminam com relativa facilidade em ambientes de saúde, principalmente por meio da contaminação de objetos e das mãos dos profissionais de saúde, podendo resultar em surtos de IRAS. Na Suíça, por exemplo, um estudo revelou que infecções causadas por patógenos Gram-negativos representam cerca de 43% dos casos totais de IRAS. Entre os organismos Gram-negativos de preocupação em ambientes de saúde, Pseudomonas aeruginosa é um patógeno de particular importância pois comumente apresenta resistência a antimicrobianos e a frequência de cepas multi-resistentes tem aumentado consideravelmente.

Qual a metodologia do estudo?

Essa publicação descreve a investigação e contenção de um surto de P. aeruginosa em 3 UTIs do hospital universitário de Zurich (Suíça), um hospital de cuidados terciários de 941 leitos. A investigação teve inicio em março de 2019 e foram incluídos no estudo todos os pacientes com pelo menos um espécimen com detecção de P. aeruginosa com padrão de resistencia igual a da cepa do surto, desde que não previamente colonizados por P.aeruginosa multirresistente. Os pacientes foram acompanhados até a alta hospitalar e o estudo se estendeu até dezembro de 2019.

A identificação de pacientes afetados (ie, colonizados ou infectados) durante o surto foi feita por meio de triagem semanal de amostras de todos os pacientes internados nas alas envolvidas. Foi realizada também amostragem ambiental de objetos potencialmente relacionados ao surto, incluído dispositivos medicos, superfícies e amostras de ar. Os espécimens positivos para P. aeruginosa foram caracterizados por testes fenotípicos de resistência e a clonalidade das amostras derivadas de pacientes foi investigada por tipagem de sequência multi-locus. Os autores também descrevem as medidas de contenção implementadas até o controle do surto.

Quais foram os principais resultados?

O surto em questão foi controlado com sucesso após 9 meses de duração, durante os quais 29 pacientes foram afetados. A presença de P. aeruginosa foi estabelecida como fator contribuinte para o desenvolvemnto de infecções invasivas em 17 pacientes (58.6%) e para a morte de 9 pacientes (31%). A cepa do surto apresentou susceptibilidade a ceftazidima-avibactam; resistência generalizada a piperacilina/tazobactam, ceftazidima, cefepima, imipenem, meropenem, gentamicina, tobramicina, ciprofloxacina e levofloxacina; e susceptibilidade variável a amicacina, ceftolozano/tazobactam, aztreonam e colistina. O rastreamento da origem do surto apontou para os sifões das pias como o foco do surto, que cessou definitivamente apenas após a remoção das pias dos leitos dos pacientes e das áreas de preparo de medicação em dezembro de 2019.

Os pacientes afetados pertenciam a 3 unidades de terapia intensiva diferentes mas que possuíam estrutura similar e que compartilhavam a rede de esgoto. Durante o período de estudo foram analisadas 255 mostras de pacientes e 276 amostras ambientais. No total, 28 das 29 amostras de pacientes e 10 das 10 amostras ambientais (9 das quais provenientes de sifões de pias) submetidas a sequenciamento multilocus indicaram clonalidade com a cepa do surto.

O controle do surto foi atingido por meio de uma estratégia multifacetada que incluiu a adoção de precauções de contato para todos os pacientes colonizados ou infectados, educação dos funcionários, maior disponibilidade de dispensers de produtos a base de álcool para higiene das mãos, intencificação dos processos de limpeza ambiental, triagem dos pacientes para a cepa do surto, redução transiente do numero de leitos das UTIs afetadas, e remoção das cortinas de separação de leitos nas UTIs do surto. Apesar da adoção de todas essas medidas e da substituição dos sifões das pias houve recrescimento da cepa do surto nos sifões novos e o controle efetivo do surto só foi concretizado com a adoção de cuidados ao paciente sem água e a remoção definitiva das pias dos leitos dos pacientes e das zonas de preparo de medicação.

 

Quais as principais conclusões dos autores?

Os autores discutem que a relevância da contaminação de sistemas de água e esgoto como fonte de transmissão de patógenos possa estar sendo subestimada para diversos patógenos, principalmente aqueles relacionados a formação de biofilme. As pias e sifões, por exemplo, sejam fatores de risco em UTIs devido a grande dificuldade/impossibilidade de desinfecção completa e que o efeito da substituição desses objetos tende a ser transitória e breve – nesse estudo foram necessarias poucas semanas para o reaparecimento da cepa resistente do surto nos sifões novos.

Nesse estudo a remoção das pias do leitos/áreas de preparo de medicação e a adoção do cuidado sem água nas UTIs, apesar de ter causado grandes mudanças nos fluxos de trabalhos e de ter sido incorporada com ceticismo inicial pelos profissionais, foi fundamental para o controle do surto e posteriormente obteve ampla aceitação. Levando em consideração, portanto, que muitas guidelines internacionais e sociedades médicas recomendam a presença de pias em leitos de terapia intensiva, os autores defendem que os achados desse estudo corroboram fortemente com a necessidade de revisão dessas diretrizes e sugerem que o uso de pias em UTIs deve ser reconsiderado e as políticas e diretrizes revistadas conforme apropriado.

Quais as limitações do estudo?

Esse estudo possui limitações. Uma das principais limitações desse estudo prospectivo foi a adoção gradual das estratégias de triagem e do foco apenas nas UTIs envolvidas no surto, de forma que os casos totais de colonização podem ter sido subestimados.

Nossa crítica importante ao estudo

Acreditamos que este estudo tem importantes problemas metodológicos e pode ser até maléfico ao recomendar remoção de pias nas UTIs do mundo, vou citar apenas alguns dos pontos importantes que devem ser considerados;

  1. Plausibilidade biológica: para se comprovar uma relação causa efeito é importnate a existência de uma explicação científica plausível. Perguntamos: qual a via de contaminação que faria bactérias presentes no sifão da pia da UTI atingirem pacientes provocando um surto? Elas sairiam “voando” de lá de dentro? Não seria muito mais plausível o sifão ser contaminado em consequência do surto, ao lavar mãos ou produtos para a saúde contaminados pelas bactérias do surto? ou até mesmo a contaminação estar na água da unidade?
  2. A biologia molecular não comprova a direção da contaminação, apenas a identidade entre as cepas isoladas.
  3. A publicação em revista de renome não é garantia da qualidade do estudo. E este pode ser o caso deste artigo.
  4. O sistema de água da UTI poderia estar contaminado, logo a remoção das pias “deu certo” por que reduziu o uso da água contaminada. Existem relatos desta contaminação em literatura e é muito mais plausível que a água contaminada provoque o surto, que a presença de bactérias no quase inascessível sifão, em condições habituais de atendimento a pacientes.
  5. A adoção da estratégia multifacetada pode ter sido a responsável pelo controle do surto, pois é impossível saber qual medida adotada foi a fundamental para este efeito.
  6. Portanto, a solução mais plausível seria controlar a qualidade da água desta unidade, com foco especial na formação de biofilmes no sistema de distribuição de água na unidade afetada e não a remoção das utilíssimas pias. Semmelweis e Florence, devem ter dado voltas no caixão………
  7. Um objetivo importante ao publicarmos estas sinopses é o desenvolvimento da consciência crítica em nosso leitor. Este foi o principal motivo da publicação deste artigo.

 

TAGs: Controle, Surto, Pseudomonas aeruginosa, UTI, Biofilme

Fonte: Schärer V, Meier MT, Schuepbach RA, et al. An intensive care unit outbreak with multi-drug-resistant Pseudomonas aeruginosa – spotlight on sinks. J Hosp Infect. 2023;139:161-167. http://doi.org/10.1016/j.jhin.2023.06.013

Links relacionados:

ANVISA revisa notas técnicas relacionadas ao controle de infecção – https://www.ccih.med.br/anvisa-revisa-notas-tecnicas-relacionadas-ao-controle-de-infeccao/

Plano nacional pra preenção da resistencia aos antimicrobianos – https://www.ccih.med.br/plano-nacional-para-a-prevencao-e-o-controle-da-resistencia-aos-antimicrobianos/

E-book gratuito sobre resistência bacteriana – https://www.ccih.med.br/ccih-cursos-lanca-e-book-gratuito-sobre-resistencia-bacteriana/

 

Sinopse por Maria Julia Ricci

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Comentários adicionais por Antonio Tadeu Fernandes

 

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