Índices de infecção hospitalar em UTI neonatal durante 21 anos comprova a importância de programas de controle de infecção e do uso de antimicrobianos num hospital brasileiro.
1. Principal Achado
O estudo demonstrou que a implementação de medidas de controle de infecção, incluindo o uso racional de antimicrobianos e treinamentos contínuos da equipe de saúde, resultou em uma baixa prevalência de sepse neonatal tardia causada por bactérias multirresistentes (MR) ao longo de 21 anos (2000–2020), sem impacto significativo na mortalidade hospitalar.
2. Importância do Tema
A sepse neonatal tardia (LONS – Late-Onset Neonatal Sepsis) representa uma causa significativa de morbidade e mortalidade neonatal, especialmente quando causada por patógenos multirresistentes. A implementação e manutenção de estratégias eficazes de controle de infecção são essenciais para minimizar o impacto da resistência antimicrobiana em unidades neonatais.
3. O que se sabia sobre o tema
- A sepse neonatal é responsável por 12-15% das mortes neonatais no mundo.
- A resistência antimicrobiana é uma consequência direta da pressão seletiva causada pelo uso inadequado de antibióticos.
- Em 1995, um surto de sepse por Enterobacter cloacae multirresistente em uma UTI neonatal brasileira levou à implementação de medidas de controle, incluindo treinamento da equipe, higiene das mãos e mudanças no protocolo de antibióticos.
- Estudos anteriores mostraram alta incidência de sepses por bacilos Gram-negativos multirresistentes em países de baixa e média renda.
4. Metodologia do Estudo
- Tipo de estudo: Estudo observacional retrospectivo (2000–2020).
- Local: Unidade neonatal de nível III do Hospital da Mulher da Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP), Brasil.
- População: 12.119 neonatos admitidos na UTI neonatal.
- Critérios de inclusão: Neonatos com diagnóstico de sepse neonatal tardia confirmada por cultura positiva para Staphylococcus aureus, bacilos Gram-negativos (GNB) e Enterococcus sp.
- Critérios de exclusão: Sepses precoces e infecções fúngicas.
- Análises estatísticas: Avaliação de tendência anual por regressão joinpoint.
5. Principais Resultados
- Taxa global de LONS: 4,6% ao longo de 21 anos.
- Tendência temporal: Houve uma redução significativa na incidência de LONS de 2000 a 2016 (p < 0,0001, inclinação -0,36). Entretanto, de 2016 a 2020, observou-se uma tendência de aumento não significativa (p = 0,08, inclinação +0,92).
- Frequência de sepses por bactérias multirresistentes: Representaram 15,8% dos casos analisados.
- Tendência da sepse por MR: Pequeno aumento ao longo dos anos, mas sem significância estatística (p = 0,08, inclinação +0,50).
- Mortalidade hospitalar: Não houve diferença estatisticamente significativa entre os casos de sepse por MR e não-MR (p = 0,413).
6. Conclusões dos Autores
- A prevalência de sepse neonatal tardia por bactérias multirresistentes permaneceu baixa e estável ao longo das duas décadas analisadas.
- O protocolo de controle de infecção e a política de uso racional de antimicrobianos foram eficazes na redução das infecções por microrganismos multirresistentes.
- A adoção de medidas contínuas de controle de infecção, como treinamento de equipes, higiene rigorosa das mãos e auditorias regulares, foram fundamentais para a manutenção dos baixos índices de infecção.
7. Fatores Limitantes e Possíveis Confundidores
- Ausência de um grupo controle: Não foi possível comparar neonatos sem sepse para identificar fatores de risco adicionais.
- Falta de dados sobre colonização materno-fetal: O estudo não analisou a transmissão vertical de patógenos.
- Mudanças nos critérios laboratoriais: As diretrizes para testes de sensibilidade antimicrobiana foram atualizadas durante o período do estudo, podendo ter influenciado os resultados.
- Variação no uso de antimicrobianos: Não foi analisada a relação entre o consumo de antibióticos e a taxa de infecção por microrganismos multirresistentes.
8. Fonte
BAZAN, Ivan Gilberto Macolla; LOBO, Barbara Barros Pereira; SCHREIBER, Angelica Zaninelli; CALIL, Roseli; MARBA, Sergio Tadeu Martins; CALDAS, Jamil Pedro de Siqueira. Long-lasting effects of control measures on trends in incidence in neonatal late-onset sepsis due to multiresistant bacteria in a Brazilian neonatal unit. American Journal of Infection Control, v. 53, p. 22-29, 2025. DOI: 10.1016/j.ajic.2024.08.007.
9. Nossos Comentários
O estudo reforça a importância de programas estruturados de prevenção e controle de infecção (PCI) em UTIs neonatais. A evidência de que estratégias simples, como a higiene das mãos e o uso criterioso de antibióticos, podem ter um impacto duradouro na redução da resistência bacteriana destaca o papel essencial do treinamento contínuo da equipe hospitalar.
Além disso, o achado de que a mortalidade hospitalar não aumentou mesmo com a presença de microrganismos multirresistentes sugere que um protocolo adequado de antimicrobianos, aliado a um monitoramento rigoroso, pode mitigar os riscos associados à resistência bacteriana.
No entanto, o aumento não significativo da sepse após 2016 levanta um alerta para a necessidade de reavaliar periodicamente as políticas de controle de infecção e intensificar a vigilância microbiológica.
Deixamos aqui nossos parabéns à equipe do da UNICAMP pela trabalho e pela publicação numa das mais prestigiadas publicações internacionais sobre controle de infecção.
10. Classificação da Multirresistência Antimicrobiana por Gênero Bacteriano
🔹 Acinetobacter sp:
- Resistência a carbapenêmicos ou ampicilina/sulbactam.
🔹 Enterococcus faecium e Enterococcus faecalis:
- Resistência à vancomicina (VRE – Vancomycin-resistant enterococcus).
🔹 Escherichia coli:
- Resistência a aminoglicosídeos e cefalosporinas de terceira geração, ou
- Resistência a carbapenêmicos, ou
- Cepas produtoras de ESBL (extended-spectrum beta-lactamase).
🔹 Citrobacter sp, Enterobacter sp, Serratia sp, Providencia sp, Proteus sp:
- Resistência a aminoglicosídeos e cefalosporinas de terceira ou quarta geração, ou
- Resistência a carbapenêmicos (CRE – carbapenem-resistant Enterobacterales).
🔹 Klebsiella sp:
- Resistência a aminoglicosídeos e cefalosporinas de terceira geração, ou
- Resistência a carbapenêmicos, ou
- Cepas produtoras de ESBL.
🔹 Morganella sp:
- Resistência a aminoglicosídeos e cefalosporinas de terceira geração.
🔹 Pseudomonas sp:
- Resistência a amicacina e ceftazidima ou cefepima, ou
- Resistência a carbapenêmicos.
🔹 Staphylococcus aureus:
- Resistência à oxacilina ou cefalosporinas de primeira geração (MRSA – methicillin-resistant Staphylococcus aureus).
11. Links relacionados:
Prevenção e controle de infecções em UTI neonatal: https://www.ccih.med.br/prevencao-e-controle-de-infeccoes-em-uti-neonatal/
Duração da antibioticoterapia empírica na suspeita de sepse neonatal: https://www.ccih.med.br/duracao-da-antibioticoterapia-empirica-na-suspeita-de-sepse-neonatal/
Infecção hospitalar em neonatos por Gram negativos – um risco crescente: https://www.ccih.med.br/infeccao-hospitalar-em-neonatos-por-gram-negativos-um-risco-crescente/
12. Sinopse por:
Antonio Tadeu Fernandes:
https://www.linkedin.com/in/mba-gest%C3%A3o-ccih-a-tadeu-fernandes-11275529/
https://www.instagram.com/tadeuccih/
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